domingo, 27 de fevereiro de 2011

Novo projeto reformula o curso Zumbi dos Palmares Pré-Vestibular


 Professores e ex-alunos debatendo novas propostas para o curso Zumbi dos Palmares

Para dar as boas vindas aos professores voluntários do curso Zumbi dos Palmares Pré-vestibular, foi realizada uma reunião na tarde de sábado, 26. Os professores Carlos, Marcos Paulo e Natália, mediados pela coordenadora da Unidade do curso Zumbi dos Palmares Pré-Vestibular de Viamão, apresentaram o projeto de reformulação Zumbi dos Palmares Pré-Vestibular Popular. Segundo o grupo de professores idealizadores do novo projeto, em vista das experiências vividas ao longo dos últimos anos no Zumbi dos Palmares Pré-Vestibular juga-se necessário re-estruturá-lo para que se possa atingir a qualidade desejada nas atividades desenvolvidas pelo cursinho.
Zumbi dos Palmares Pré-vestibular nasceu como alternativa para que os jovens carentes pudessem usufruir seu direito à educação pública e de qualidade. Há mais de 15 anos, originou-se a ideia da criação desse curso. Em 1995, ocorreu, em Porto Alegre, o VI Encontro de Educadores Negros, promovido por Agentes da Pastoral do Negro, onde estava presente o Frei David Raimundo dos Santos, idealizador do Educafro, entidade ligada à promoção da educação para negros e carentes, através de cursos pré-vestibulares comunitários.
Enilza saudou os professores e ex-alunos presentes na reunião lembrando os ensinamentos de Paulo Freire sobre o aprendizado em comunhão.
A reunião foi o encontro da formação pedagógica destinados aos professores do curso Zumbi dos Palmares com o objetivo de motivar e inspirar os voluntários para facilitar a permanência dos estudantes, a partir do reinício das aulas marcada para 2 de maio.
A novidade na reformulação do curso pré-vestibular está no “trios de coordenação” que dilui a coordenação em três grupos de trabalho com a intenção de dinamizar o andamento das atividades dividindo as responsabilidades entre os colaboradores nos seguintes setores: Assuntos Administrativos, Assuntos Pedagógicos e Curriculares, e Assuntos Financeiros. Também foi foco de debate a disciplina Cultura e Cidadania, que é ministrada com mesma carga horária das outras e passará a ter aulas quinzenais (32 encontros onde serão desenvolvidos 16 temas), alia-se as aulas de redação (técnica e escrita), metodologia diversificada (filmes, recortes de veículos de notícias, saídas), e formação e organização dessa disciplina terá supervisão de um professor específico.
Chamou atenção a forma de seleção de professores e alunos. Para professores: cartazes fixados em vários pontos da cidade, Faculdades, internet. O professor interessado em fazer parte do curso Zumbi dos Palmares deverá entrar em contato através de dois números de telefones fixados ali. As informações do interessado deverão ser repassados ao então professor regente da disciplina para encaminhamento de entrevista e uma simulação de mini-aula.
Para alunos o mesmo processo de seleção de professor mas o aluno será recebido e apresentado ao espaço por um colaborador do Zumbi dos palmares Pré-Vestibular e em forma de uma conversa espontânea o aluno interessado será informado das aulas, da história do curso pré-vestibular, período e horário das aulas, da turma como ocorrerá e os critérios utilizados na seleção e demais informações.
Outra novidade é Monitoria e orientação do estudo dos estudantes que buscará completar os estudos do aluno Zumbi dos Palmares Pré-vestibular nos horários livres (estará dividido entre os professores da disciplina).
Todo o evento foi em círculo de diálogo pondo os ponto de vistas e registros dos principais tópicos da reunião.

*Professor da Unidade Porto Alegre Zumbi dos Palmares Pré-Vestibular Tyrone Andrade de Mello e professor da Rede de Ensino do Estado do RS da cidade de Porto Alegre.

Cronograma do curso Zumbi dos Palmares

26 de fevereiro: apresentação do Projeto. Definir: orçamento para a divulgação dos trios de coordenadorias, cronogramas das próximas atividades;
12 de março: definir multirões de divulgação para novos alunos e professores para ajeitar biblioteca e livros. Combinar divulgação professores e estudantes;
26 de março: Encontro de professores, alunos e colaboradores com o objetivo de elaborar o Novo Projeto. A partir das 9 horas da manhã;
11 a 16 de abril: inscrições de alunos. agendamento das entrevistas individuais. A combinar seleção dos candidatos e combinar reunião com a participação de todos os professores; conhecimento e discussão dos perfis sócio-antropológico dos estudantes;
25 de abril: divulgaçãio dos resultados da seleção dos estudantes;
26 e 27 de abril: início das matrículas;
29 de abril: prazo final de entrega de Planos de Ensino e Apostilas;
30 de abril: aula inaugural
2 de maio: início das aulas
14 de maio: atividade pedagógica: "UFRGS portas abertas" - primeiro contato do pré-universitário com a UFRGS.

sexta-feira, 18 de fevereiro de 2011

Blues Reacionário

Backlash Blues

Blues Reacionário

Mr. Backlash, Mr. BacklashSr. Reacionário, Sr. Reacionário
Just who do think I amQuem você pensa que sou?
You raise my taxes, freeze my wagesVocê aumenta meus impostos, congela meu salário
And send my son to VietnamE manda meu filho para o Vietnã
You give me second class housesVocê me dá casas de segunda classe
And second class schoolsE escolas de segunda classe
Do you think that alla colored folksVocê acha que todas as pessoas de cor
Are just second class foolsSão simplesmente tolos de segunda classe
Mr. Backlash, I'm gonna leave youSr. Reacionário, eu vou deixar você
With the backlash bluesCom o blues da reação
When I try to find a jobQuando eu tento encontrar um emprego
To earn a little cashPara ganhar algum dinheiro
All you got to offerTudo que você tem para oferecer
Is your mean old white backlashÉ a sua branca, antiquada e maléfica reação
But the world is bigMas o mundo é grande
Big and bright and roundGrande e brilhante e redondo
And it's full of folks like meE está cheio de pessoas como eu
Who are black, yellow, beige and brownQue são negras, amarelas, bege e marrom
Mr. Backlash, I'm gonna leave youSr. Reacionário, eu vou deixar você
With the backlash bluesCom o blues da reação
Mr. Backlash, Mr. BacklashSr. Reacionário, Sr.Reacionário 
Just what do you think I got to loseO que você acha que eu tenho a perder
I'm gonna leave youEu vou deixar você
With the backlash bluesCom o blues da reação
You're the one will have the bluesVocê é o cara que terá o blues
Not me, just wait and seeNão eu, espere e verá
Uma pérola de Nina Simone, Backlash blues. No vídeo ela faz um monte de improvisações, então está um tanto diferente da letra da música, mas a idéia é a mesma. Fiz uma tradução amadora da letra para português. Fiz o melhor que pude, mas não está totalmente confiável. Foi particularmente difícil traduzir "Backlash", se alguém tiver uma idéia melhor que "reacionário" avise! Algo que foi impossível traduzir foi a palavra "blues", que em inglês designa tanto o gênero musical, como dá uma idéia de depressivo, melancólico. Deixei tudo como "blues" mesmo, mas tenha em mente a duplicidade de sentido ao ouvir a música.

Essa postagem veio de uma dica do também jogamos sapato.

quarta-feira, 16 de fevereiro de 2011

Cotas da igualdade

Debate sobre as cotas raciais nas universidades brasileiras trouxe de volta velhos clichês como a suposta “democracia racial” brasileira e o reducionismo econômico, que insiste em negar a diferença de tratamento entre brancos e negros da mesma classe social

Por Túlio Vianna

De todas as ficções com as quais o sistema capitalista se legitima, a mais hipócrita delas é a da igualdade de oportunidades. A meritocracia é uma ficção que só se realizaria se não houvesse heranças. No mundo real, ninguém começa a vida do zero; somos herdeiros não só do patrimônio, mas da cultura e da rede de relacionamentos de nossos pais. Alguns já nascem na pole position, com os melhores carros; outros se digladiam na última fila de largada em calhambeques não muito competitivos.

Quem é o melhor? O piloto que vence a corrida largando na pole position e com o melhor carro ou aquele que largou em último e chega com seu calhambeque em segundo lugar? Quem tem mais mérito? O candidato que estudou a vida inteira em excelentes escolas particulares e passou em primeiro lugar no vestibular ou aquele que passou em último, tendo estudado somente em escolas públicas, enquanto trabalhava oito horas por dia para ajudar seus pais?

As cotas universitárias não foram criadas para coitadinhos. Elas existem para vencedores. Para alunos que são tão brilhantes que, mesmo correndo durante 17 anos em calhambeques, ainda conseguem chegar próximos daqueles que dirigem os melhores carros. Para quem, contrariando todas as expectativas, venceu o sistema que lhe negou as oportunidades necessárias para que seu talento florescesse em plenitude. As cotas são um mecanismo para privilegiar o mérito pessoal em detrimento da condição social como critério de seleção.

É relativamente fácil perceber como a desigualdade econômica afeta o desempenho acadêmico dos candidatos ao vestibular. Mesmo quem nunca foi pobre consegue imaginar as dificuldades de alguém que estudou em uma escola fraca, sem dinheiro para comprar material escolar e tendo que trabalhar para ajudar nas despesas da casa. Difícil mesmo é um branco perceber como a desigualdade racial dificulta o ingresso de um negro na universidade.

O racismo no Brasil é comumente negado com base em duas ideologias complementares: o “mito da democracia racial” e o reducionismo econômico. A primeira nega, contra todas as evidências fáticas, a existência da discriminação racial brasileira; a segunda reconhece o tratamento desigual, mas atribui sua causa à desigualdade econômica. Juntas, estas duas ideologias fundamentam um argumento recorrente de que o negro seria discriminado no Brasil não pela cor de sua pele, mas por sua pobreza.

Democracia racial
O mito da democracia racial brasileira, como todo mito que se preze, tem suas origens incertas. Muitos atribuem sua gênese à obra magna de Gilberto Freyre, Casa-grande & Senzala (1933), ainda que a expressão não conste expressamente no livro e só tenha sido usada por Freyre muito mais tarde, sob influência de outros intelectuais. Fato é que, independentemente do pensamento ou da vontade de Freyre, sua obra foi interpretada por muitos como a prova cabal de que as relações entre brancos e negros no Brasil se deram de forma muito mais cordial do que na América do Norte, até em função da miscigenação ocorrida por aqui, o que explicaria a suposta democracia racial existente no Brasil.

E foi com base nesta ideologia da democracia racial que o senador Demóstenes Torres (DEM-GO) defendeu a ação de Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) nº 186, com a qual o seu partido requereu ao Supremo Tribunal Federal (STF) que declarasse inconstitucional o sistema de cotas raciais nos vestibulares brasileiros. Em audiência pública ocorrida no STF em 3 de março de 2010, o senador afirmou: "Nós temos uma história tão bonita de miscigenação... (Fala-se que) as negras foram estupradas no Brasil. (Fala-se que) a miscigenação deu-se no Brasil pelo estupro. (Fala-se que) foi algo forçado. Gilberto Freyre, que é hoje renegado, mostra que isso se deu de forma muito mais consensual."

Esta visão romanceada da escravidão no Brasil, que foi duramente criticada por Florestan Fernandes e seus colegas da USP em minuciosos estudos realizados a partir da década de 1950, ainda hoje encontra seus adeptos, não obstante seu visível anacronismo. A ditadura militar brasileira – que aposentou compulsoriamente Florestan em 1969 – esforçou-se para garantir uma sobrevida à ideologia da democracia racial, incutindo na população a ideia de que não há racismo no Brasil.

Os números do Relatório Anual das Desigualdades Raciais no Brasil 2007-2008, porém, mostram uma realidade bastante diferente da propagada pela ideologia da democracia racial. O IDH (Índice de Desenvolvimento Humano) de pretos e pardos no Brasil é de 0,753; o de brancos é de 0,838. Dos 513 deputados eleitos em 2006, apenas 11 eram pretos e 35 pardos. No início de 2007, dos 81 senadores 76 eram brancos, enquanto somente 4 eram pardos e 1 preto. Dos 68 juízes dos Tribunais Superiores, apenas dois foram identificados como pretos e dois como amarelos, sendo todos os demais brancos.

No ensino superior a democracia racial é uma ficção. Em 2006, um em cada cinco brancos em idade esperada para ingressar no ensino superior estava na universidade, enquanto 93,7% dos pretos e pardos na mesma faixa etária estavam excluídos do ensino superior público ou privado.

No corpo docente das universidades brasileiras a situação é ainda pior. Um estudo do professor de Antropologia da Universidade de Brasília (UNB) José Jorge de Carvalho avaliou 12 das principais universidades brasileiras e constatou que o número de professores negros (pretos e pardos) não chega sequer a 1%. Dos 4.705 professores da Universidade de São Paulo (USP) no período avaliado, apenas 5 (0,1%) eram negros. Na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), dos 2.700 professores, 20 (0,7%) eram negros. Das instituições pesquisadas, a com maior pluralismo racial do corpo docente foi a UNB, na qual, dentre 1.500 professores, havia 15 (1%) negros.

Reducionismo econômico
Na impossibilidade de negar os números que indicam claramente a discriminação racial no Brasil, os adeptos da ideologia da democracia racial procuram justificar as desigualdades apontando como causa da discriminação não a etnia, mas a condição econômica dos negros, na média bastante inferior à dos brancos. Este argumento tem seduzido, inclusive, muita gente de esquerda que, em uma leitura ortodoxa do marxismo, entende que todo conflito social pode ser reduzido a um conflito de classes.

Uma análise mais atenta da realidade social, porém, constata que, para além do poder econômico que impõe a dominação de ricos sobre pobres, há também micropoderes que impõem relações de dominação em função de outras diferenças sociais, tais como as existentes entre brancos e negros, homens e mulheres, heterossexuais e homossexuais, nacionais e estrangeiros e tantas outras.

É tentador imaginar que um estudante negro que estudou toda a vida na mesma sala de aula de um colega branco, com renda familiar semelhante, tenha a mesma chance que ele de ingressar em uma universidade. Na vida real, porém, as dificuldades do estudante negro são sempre maiores.

Ainda que tanto o estudante negro quanto o branco assistam às mesmas aulas e estudem pelos mesmos livros, este é apenas um aspecto muito reduzido de sua formação. A criança e o adolescente refletirão boa parte das expectativas que seus pais, professores e colegas depositam nele. Se o aluno branco é visto por seus professores como “brilhante” e o negro como “esforçado”, esta diferença acumulada durante mais de 10 anos de estudos resultará em níveis de autoconfiança bastante diferentes.

O negro já entra na escola com um menor status social perante seus colegas e isso lhe será relembrado durante todo o período escolar, desde os apelidos que lhe serão dados até o eventual desafio de um namoro interracial na adolescência. Se precisar trabalhar para ajudar nas despesas de casa, o adolescente negro terá maiores dificuldades em ser aceito em um emprego do que o adolescente branco, ganhará menos e exercerá piores funções. Haverá uma probabilidade muito maior de que os adolescentes negros sejam abordados e revistados pela polícia do que o mesmo ocorrer com seus colegas brancos; aqueles terão sempre seguranças seguindo seus passos em shoppings centers e boates. As revistas e os programas de TV lhe lembrarão o tempo todo que suas chances de ascensão social se resumem a ser um exímio jogador de futebol ou uma sambista destinada a ser símbolo sexual somente durante o carnaval.

Se o adolescente branco tem como desafio vencer a pobreza para passar no vestibular, o adolescente negro, além da pobreza, precisará vencer o preconceito. Precisará ir além da expectativa social que lhe atribuiu um lugar na sociedade que ele não quer ocupar. E isso, muitas vezes, é bem mais difícil do que simplesmente aprender a matéria que cai na prova.

Não se trata de uma mera dominação econômica de uma classe sobre outra, mas de uma dominação cultural que durante séculos incutiu no inconsciente coletivo a imagem do negro como raça inferior. As cotas raciais a médio e longo prazo permitirão que mais e mais negros sejam vistos no mercado de trabalho como profissionais de sucesso, alterando as expectativas sociais que são atribuídas aos jovens negros.

Quando os cirurgiões e os juízes negros deixarem de ser confundidos com pacientes e réus, não precisaremos mais de cotas. Até lá, as cotas raciais cumprirão não só o papel de promoção da igualdade racial, mas principalmente farão justiça com o estudante negro que enfrentou tantos percalços na sociedade racista em que vive. Reconhecerão o mérito de quem desafiou todas as expectativas sociais em contrário e continuou estudando para ingressar em uma universidade. O mérito de quem teima em ser um vencedor.

segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

O racismo de Monteiro Lobato

No último semestre o MEC emitiu um parecer técnico avaliando que o livro Caçadas de Pedrinho, de Monteiro Lobato, possui conteúdo racista. O parecer recomenda que nas próximas edições do livro seja acrescentada uma nota alertando aos leitores, e que ele só seja utilizado em escolas por professores que estejam preparados para lidar com a questão. A medida gerou uma polêmica incentivada por veículos da grande mídia, que acusavam a medida de autoritária, de ato de censura, de ditadura do "politicamente correto", etc. No excelente artigo que segue, Ana Maria Gonçalves rebate com muita propriedade essas críticas e defende o parecer do MEC. Vale a pena a leitura.

"tenho a sensação de que racismo sempre foi tratado como problema alheio - é o outro quem sofre e é o outro quem dissemina"
Ana Maria Gonçalves, negra, escritora, autora de Um defeito de cor 

Não é sobre você que devemos falar

Monteiro Lobato: um homem com um projeto para além do seu tempo - Caçadas de Pedrinho, publicado em 1933, teve origem em A caçada da onça, de 1924. Portanto, poucas décadas após a abolição da escravatura, que aconteceu sem que houvesse qualquer ação que reabilitasse a figura do negro, que durante séculos havia sido rebaixada para se justificasse moralmente a escravidão, e sem um processo que incorporasse os novos libertos ao tecido da sociedade brasileira. Os ex-escravos continuaram relegados à condição de cidadãos de segunda classe e o preconceito era aceito com total normalidade. Eles representavam o cisco incômodo grudado à retina, o "corpo imperfeito" dentro de uma sociedade que, a todo custo, buscava maneiras de encobri-lo, desbotá-lo ou eliminá-lo, contando com a colaboração de médicos, políticos, religiosos e outros homens influentes daquela ápoca. Um desses homens foi o médico Renato Kehl, propagador no Brasil das idéias do sociólogo e psicólogo francês Gustave Le Bon, que defendia a "superioridade racial e correlacionava as raças humanas com as espécies animais, baseando-se em critérios anatômicos como a cor da pele e o formato do crânio", segundo o livro Raça Pura, - Uma história da eugenia no Brasil e no mundo, de Pietra Diwan para a Editora Contexto. Renato Kehl reuniu ao seu redor uma ampla rede de intelectuais, com quem trocava correspondência e ideias constantemente, todos adeptos, defensores e propagadores da eugenia, assim definida por ele em 1917: "É a ciência da boa geração. Ela não visa, como parecerá a muitos, unicamente proteger a humanidade do cogumelar de gentes feias".

Em 1918 foi fundada a Sociedade Eugênica de São Paulo - SESP, contando com cerca de 140 associados, entre médicos e membros de diversos setores da sociedade que estavam dispostos a "discutir a nacionalidade a partir de questões biológicas e sociais", tendo em sua diretoria figuras importantes como Arnaldo Vieira de Carvalho, Olegário de Moura, Renato Kehl, T. H. de Alvarenga, Xavier da Silveira, Arhur Neiva, Franco da Rocha e Rubião Meira. A sociedade, suas reuniões e ideias eram amplamente divulgadas e festejadas pela imprensa, e seus membros publicavam em jornais de grande circulação como Jornal do Commercio, Correio Paulistano e O Estado de São Paulo. Lobato, como um homem de seu tempo, não ficaria imune ao movimento, e em abril de 1918 escreve a Renato Kehl: "Confesso-me envergonhado por só agora travar conhecimento com um espírito tão brilhante quanto o seu, voltado para tão nobres ideais e servido, na expressão do pensamento, por um estilo verdadeiramente "eugênico", pela clareza, equilíbrio e rigor vernacular." Era o início de uma grande amizade e de uma correspondência ininterrupta até pelo menos 1946, dois anos antes da morte de Monteiro Lobato. Os eugenistas agiam em várias frentes, como a questão sanitária/higienista, que Lobato trata em Urupês, livro de contos onde nasce o famoso personagem Jeca Tatu, ou a racial, sobre a qual me aterei tomando como ponto de partida outro trecho de uma das cartas de Monteiro Lobato a Renato Kehl: "Renato, Tú és o pai da eugenia no Brasil e a ti devia eu dedicar meu Choque, grito de guerra pró-eugenia. Vejo que errei não te pondo lá no frontispício, mas perdoai a este estropeado amigo. [...] Precisamos lançar, vulgarizar estas idéias. A humanidade pecisa de uma coisa só: póda. É como a vinha. Lobato."

domingo, 13 de fevereiro de 2011

Divulgado resultado da 3ª chamada do Sisu

O Ministério da Educação divulgou na manhã deste domingo a terceira lista de aprovados no Sisu (Sistema de Seleção Unificada), que seleciona alunos para vagas em universidades públicas com base na nota do Enem (Exame Nacional do Ensino Médio).

As relações de estudantes selecionados está disponível no site do MEC. O acesso deve ser feito por meio do número de inscrição e senha do Enem.

As matrículas dos candidatos selecionados na terceira chamada devem ser feitas nos dias 15 e 16 de fevereiro. A lista dos documentos que os alunos precisam apresentar está disponível no site do programa no boletim individual do participante. Neste ano, são oferecidas 83 mil vagas em 83 instituições de ensino superior.

LISTA DE ESPERA
Os candidatos não selecionados ou que foram selecionados em sua segunda opção e desejam continuar concorrendo em sua primeira opção, podem manifestar interesse em participar da Lista de Espera que poderá ser utilizada pelas universidades e institutos federais para o preenchimento das vagas.

A confirmação da participação na Lista de Espera no curso em que efetuou sua inscrição deve ser feita de 13 a 17 de fevereiro, por meio do acesso ao Boletim Individual do Aluno.


Retirado de http://www1.folha.uol.com.br/saber/874950-mec-divulga-3-chamada-de-aprovados-do-sisu.shtml

sábado, 12 de fevereiro de 2011

Matrículas para calouros da UFRGS começam depois de amanhã

Acontecem de segunda e quarta-feira da próxima semana, de 14 a 16 de fevereiro, as matrículas presenciais dos calouros aprovados no Vestibular 2011, com ingresso no primeiro semestre. Os horários e locais de matrícula, assim como a documentação necessária e o Calendário Acadêmico de 2011, estão disponíveis aquiO não atendimento aos prazos estabelecidos implica a perda definitiva da vaga. Os classificados para o segundo semestre devem ficar atentos ao primeiro chamamento, que acontece no dia 19 de fevereiro, pois podem ter antecipado seu ingresso. Informações adicionais sobre as matrículas podem ser obtidas com o Departamento de Controle e Registro Acadêmico - DECORDI, pelo e-mail decordi@decordi.ufrgs.br ou pelo telefone 3308-3258, nos seguintes horários: das 13h30min às 17 horas, às segundas-feiras; das 8h30min às 17 horas, de terça a quinta; e das 8:30 às 12 horas, às sextas. Outras dúvidas podem ser tiradas no informativo aos calouros que se encontra no site www.prograd.ufrgs.br/aluno/matricula-calouros.

sexta-feira, 11 de fevereiro de 2011

MEC divulga resultado da 2ª chamada do ProUni

O MEC (Ministério da Educação) divulgou na manhã desta sexta-feira a lista dos pré-selecionados em segunda chamada para receber uma bolsa do ProUni (Programa Universidade para Todos). O resultado pode ser conferido na internet por cada candidato (confira aqui).

Mais de 1 milhão de candidatos se inscreveram para disputar uma das 123 mil bolsas oferecidas para o primeiro semestre de 2011. A primeira chamada foi divulgada no dia 28 de janeiro, e o prazo para matrícula e comprovação de informações ia até o dia 4 de fevereiro.

Já os aprovados em segunda chamada têm até 17 de fevereiro para comparecer às instituições de ensino para onde foram selecionados e efetuar a matrícula e a comprovação das informações prestadas durante as inscrições. A lista dos documentos que devem ser apresentados está disponível no site do programa.

Do total de bolsas oferecidas, 80,5 mil são integrais e 42,6 mil parciais, que cobrem 50% da mensalidade. As integrais são destinadas aos alunos com renda familiar mensal per capita de até um salário mínimo e meio. As parciais são para os candidatos cuja renda familiar mensal per capita não passe de três salários mínimos.
Para participar do ProUni, era preciso ter cursado todo o ensino médio em escola pública ou estabelecimento privado com bolsa integral. Era necessário ainda ter participado do Enem (Exame Nacional do Ensino Médio) de 2010, atingido o mínimo de 400 pontos na média das cinco provas e não ter tirado zero na redação.

Caso ainda haja bolsas disponíveis após as matrículas dessa segunda chamada, o MEC abrirá um novo período de inscrições entre os dias 21 e 24 de fevereiro. Quem já tiver conseguido uma bolsa na primeira etapa não poderá participar da segunda seleção.


Retirado de : http://www1.folha.uol.com.br/saber/874067-mec-divulga-resultado-da-2-chamada-do-prouni.shtml

quarta-feira, 9 de fevereiro de 2011

Cultura negra no Rio Grande do Sul - Livro, filme e músicas

O Projeto RS Negro reuniu um pacote de materiais didáticos multimídia sobre a cultura negra no Rio Grande do Sul, produzidos pela PUC-RS. O kit deve ser distribuído em escolas do estado, como já foi feito nas escolas de Venâncio Aires, mas também está disponível para acesso gratuito no site do projeto. Estão lá o livro RS NEGRO: Cartografias sobre a produção do conhecimento (há uma versão similar sobre a cultura indígena no estado aqui); o documentário Sou, sobre o poeta negro gaúcho Oliveira Silveira, e sua luta com o movimento negro pelo reconhecimento do dia da consciência negra; o CD de músicas Negro Grande; um conjunto de postêrs relacionados à temática em alta resolução; apresentações de slides a serem usadas em aulas que trabalhem o tema; e uma revista produzida pela equipe do projeto.

Passa quase desapercebido para quem navega no site do projeto o vídeo do encontro entre a atriz Vera Lopes, a jornalista Sátira Machado e Naiara Rodrigues Silveira, filha de Oliveira Silveira. Só pelo poema do Oliveira Silveira que abre o vídeo já vale a pena assistir. Assista aqui.

terça-feira, 8 de fevereiro de 2011

Racismo no exército - Perseguição ao Capitão Marinho em Bagé/RS

Em janeiro desse ano (2011) um capitão negro do exército foi preso em Bagé, no Rio Grande do Sul. Seus crimes: Escrever o livro “Exército na Segurança Pública: uma guerra contra o povo brasileiro”, em que faz críticas ao envolvimento dos militares em ações de Polícia, como no caso da participação na invasão do Morro do Alemão e Vila Cruzeiro, no Rio; Denunciar que a Biblioteca do Exército lançou com dinheiro público o livro “Não somos racistas”, do jornalista Ali Kamel; Conceder entrevistas falando de segurança pública e racismo.

Entenda o caso pelas palavras do próprio Capitão Marinho no texto abaixo. Leia também uma entrevista recente dele ao Afropress clicando aqui.


A MINHA LIBERDADE É INEGOCIÁVEL!

Inicio este texto pedindo desculpas para minhas amigas e meus amigos pela minha abstenção, pois faz mais de quatro meses que não escrevo um texto para postar no BLOG. Vários foram os motivos que fizeram eu parar de escrever, mas o principal foi eu mostrar que sou um militar disciplinado e que jamais irei difamar a Instituição a qual pertenço.

Nestes últimos quatro meses, tornaram-se incontáveis os e-mail que recebi solicitando que escrevesse sobre os mais variados temas, entretanto, após a briga contra meu "EU", conseguia resistir a tentação de escrever, que era retroalimentada por cada e-mail que recebia. Porém, os ensinamentos de Nelson Mandela contidos no livro "Conversas que Tive Comigo" como: "Não fuja dos problemas; encare-os! Porque se você não lidar com eles, estarão sempre com você", mais os ensinamentos de Martin Luther King Jr. contidos no livro "Um Grito de Liberdade" como: "O que mais me preocupa é o silêncio dos bons", somados aos fatos que relatarei no decorrer deste texto, venceram a minha resistência de manter-me calado!

No dia 7 de janeiro deste ano (2011), fui preso sobre o argumento que tinha desertado do Exército. Como meu orgulho de envergar o uniforme verde-oliva é de conhecimento de todos, pois sempre faço questão de ressaltar isso nos meus textos, vários sites da internet, jornais impressos, revistas e programas de rádio e televisão publicaram que a minha prisão foi arbitrária (esta argumentação foi ratificada pela Justiça Militar) e, consequentemente, surgiram, na mídia, três causas para explicar o porquê fui preso injustamente: uma diz respeito ao fato deu ter lançado, pela editora JURUÁ, o livro "EXÉRCITO NA SEGURANÇA PÚBLICA: UMA GUERRA CONTRA O POVO BRASILEIRO!"; outra se refere ao fato deu ter publicado aqui no blog (www.capitaomarinho.blogspot.com) textos denunciando a editora do Exército (BIBLIEX) por usar  o dinheiro do povo na publicação de livro que nega o racismo no Brasil e afrontar as políticas públicas de ações afirmativas; e a terceira causa levantada, foi pelo fato deu dar entrevistas em jornais e programas de rádio e televisão falando sobre segurança pública e racismo.

Depois que fui solto, resolvi não dar nenhuma entrevista sobre a ARBITRARIEDADE da minha  prisão por entender que poderia ser hipócrita se negasse que as causas levantadas pela mídia  eram verdadeiras, ou poderia ser leviano caso eu as ratificasse. Por estes e outros motivos, preferi não comentar o fato e seguir, normalmente, a minha vida profissional. DOCE ILUSÃO! Ao me reapresentar no quartel, fui designado para exercer uma função que não existe no regulamento castrense e recebi a chave de uma sala para ficar durante o expediente. Trabalho que é bom, não recebi nenhum. Será que alguma empresa privada paga salário, ainda que seja muito menor do que eu recebo no Exército, para que seu funcionário fique olhando o tempo passar? Isso, além de ser humilhante para mim, é um total descaso com o dinheiro público!

Esta semana, fui advertido em reunião onde estava presente todos os oficiais do Batalhão, sendo eu o terceiro mais antigo na escala hierárquica, pelo fato de não deixar um subtenente, com mais de 40 anos de idade, realizar atividade física. Ele estava com a pressão arterial 20 por 12 (muito alta) e teria que praticar atividade física às 14:30h (15:30h no horário de verão) estando a temperatura marcando 36°C. Fui advertido pelo fato de entenderem que como o militar não tinha atestado médico (o médico do quartel deu baixa do Exército), ele teria de realizar os exercícios. Já presenciei e conheço vários casos de colegas que morreram durante ou após a realização de atividades físicas. Quantos pais de família ainda perderão suas vidas pelo fato de terem comandantes insensíveis ou imprudentes? 

Diante das situações expostas acima, decidi entrar com um documento pedindo resposta sobre outro documento o qual solicitei as minhas férias atrasadas (2009), pois já tinha passado o prazo regulamentar para responderem sobre minhas férias e nada foi feito. Gostaria de ressalta que férias é um direito previsto na Constituição Federal! Ontem, ao término do expediente, recebi uma notificação NEGANDO as minhas férias e no conteúdo da notificação há uma ordem que me causou ainda mais ojeriza pela gravidade do ABUSO DE PODER, a ordem é que eu não posso me ausentar da cidade de Bagé-RS sem autorização por escrito do comandante, ou seja, continuo preso, visto que meu direito de ir e vir mais uma vez foi cerceado de forma brutal! Até quando vão existir militares desrespeitando, impunemente, os princípios constitucionais? Muitos dizem que brigo contra o sistema e alguns me chamam de "burro" ou ingênuo porque brigo contra algo invencível. Eu não brigo contra o sistema! Eu brigo com pessoas que tentam impedir que o Exército brasileiro marche junto com a democracia e não respeitam os DIREITOS HUMANOS consagrados na Constituição Federal. E caso eu não vença esta briga, me consolarei nos dizeres de um dos maiores educadores da história brasileira, Darcy Ribeiro: "Tentei fazer o Brasil desenvolver-se autonomamente e fracassei. Mas os fracassos são as minhas vitórias. Eu detestaria estar no lugar de quem me venceu". Tenho certeza que o Comandante do Exército (General Enzo) vai mostrar para a sociedade brasileira que fatos como o quê eu estou vivendo e relatando não são admissíveis e serão apurados porque o Exército brasileiro respeita e cumpre as leis do País!

Por fim, Bob Marley dizia: "É melhor atirar-se à luta em busca de dias melhores, mesmo correndo o risco de perder tudo, do que permanecer estático, como os pobres de espírito, que não lutam, mas também não vencem, que não conhecem a dor da derrota, nem a glória de ressurgir dos escombros. Esses pobres de espírito ao final de sua jornada na Terra não agradecem a Deus por terem vivido, mas desculpam-se perante Ele, por terem apenas passado pela vida". Após esta citação eu concluo com as seguintes palavras: ESCREVI ESTE TEXTO PORQUE A MINHA LIBERDADE É INEGOCIÁVEL!

segunda-feira, 7 de fevereiro de 2011

Exibição gratuita do documentário "O Zelador"


O Africanamente, escola de capoeira angola, convida para uma exibição gratuita do documentário "O Zelador", com a presença de seu protagonista Jonas Rabelo, o Mestre Russo.

O filme foi premiado em diversos países da Europa, e conta a trajetória da Capoeiragem no Rio de Janeiro, a partir da história de vida do Mestre Russo e de seus amigos na resistência em manter a Roda semanal de Capoeira de rua mais antiga do Brasil, na cidade de Duque de Caxias (RJ), local que recebe pessoas do mundo todo, independente de linhagem ou estilo de jogar capoeira. Nos dias seguintes haverão Rodas e Oficinas de Capoeira Angola com Mestre Russo. Em breve a programação completa do evento e os locais das rodas e oficinas.
Quando? Dia 16/02 às 19:30h
Onde? Usina do Gasômetro, Sala PF Gastal - Porto Alegre
Quanto? De graça!
Mais informações: africanamente.poa@hotmail.com / (51) 9965-9335 

domingo, 6 de fevereiro de 2011

Entrevista - Os brasileiros precisam conhecer a história dos negros

retirado de: http://africas.com.br/site/index.php/archives/7765
Responsável pelo parecer do Conselho Nacional de Educação que instituiu, há alguns anos, a obrigatoridade do ensino da história da África e de seus descendentes nas escolas brasileiras, a gaúcha Petronilha Beatriz Gonçalves e Silva é titular de Ensino-aprendizagem-Relações Étnico-Raciais da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), pesquisadora do Núcleo de Estudos Afro-brasileiros e coordenadora do Grupo Gestor do Programa de Ações Afirmativas da mesma universidade. Com vasto currículo acadêmico, a professora possui, ainda, graduação em Português e Francês (1964), mestrado em Educação (1979) e doutorado em Ciências Humanas-Educação (1987), pela Universidade Federal do Rio grande do Sul. No exterior, cursou especialização em Planejamento e Administração no Instituto Internacional de Planejamento da UNESCO, em Paris (1977), e fez estágio de Pós-Doutorado em Teoria da Educação, na University of South Africa, em Pretória, África do Sul (1996). Com toda essa bagagem, tornou-se uma das maiores especialistas em Educação Étnico Racial no Brasil e a primeira negra a pertencer ao Conselho Nacional de Educação. Com exclusividade à RAÇA BRASIL, Petronilha fala sobre os rumos da educação e da Lei 10.639, além do polêmico caso do livro Caçadas de Pedrinho, do escritor Monteiro Lobato. “Ele é um grande literato, mas era racista”, afirma

Como nasceu a ideia de criar uma lei para ensinar nas escolas a história da Àfrica e seus descendentes?
Em 2002, fui conduzida ao Conselho Nacional de Educação por indicação do Movimento Negro. Aí, começaram a chegar algumas denúncias, como a acorrida num desfile de 7 de setembro, no Tocantins. Não me lembro o nome da cidade, mas não foi na capital. No evento desfilaram crianças de colégio. Um grupo desfilou andando no asfalto com os pés descalços como escravizados e uma menina branca, loura, carregada numa cadeirinha por dois meninos negros. Diziam que estavam contando a história dos transportes. Essa situação toda foi fotografada e fizeram uma exposição na prefeitura da cidade. O movimento negro local pediu para que fosse retirada. Como não o fizeram, o caso foi parar no Conselho.
Assim como a denúncia do livro de Monteiro Lobato?
Sim, mas chegavam casos dos mais variados. Lembro- me, por exemplo, do pai de um menino negro. A criança não queria ir à escola e o pai, querendo saber o motivo, descobriu que era por causa de um livro com uma representação negativa em imagens. Talvez as pessoas tivessem uma intenção, digamos, boa, só para dar um exemplo. Esse segundo caso chegou por meio do MEC.
O primeiro caso, do Tocantins, encaminhamos para a Secretaria do MEC de Educação Fundamental que, por sua vez, tomou providência. Isso para lhe dar um exemplo do tipo de demanda que chegava ao Conselho. Ao mesmo tempo, a gente sabia que havia uma expectativa, claro, do Movimento Negro. Eu propus que houvesse alguma manifestação do Conselho. Convidei militantes que estavam em Brasília para, quando estivéssemos em reunião do Conselho, participássemos paralelamente da reunião. Assim, vários militantes passaram a companhar as reuniões do Conselho. Surgia o embrião que resultaria na Lei 10.639.
Mas antes disso já havia professores e ativistas negros que trabalhavam a questão racial dentro das escolas em todo o Brasil.
Sim, havia um entendimento no Movimento Negro e professores que já trabalhavam com história e cultura afro-brasileira e africana, mas tinha que haver uma mudança nas relações entre negros e não negros, e isso exigiria a elaboração de diretrizes. Então, reunimos um grupo por, praticamente, dois anos.
Nessa comissão é que nos organizamos, de uma maneira informal, sem a oficialização do Conselho, e fizemos também uma programação, porque haveria mudança de governo. No mês de dezembro, apresentamos para a comissão que cuidava da transição uma proposta do que seria importante nos diferentes níveis de ensino, relativamente à população negra para um governo bom. Voltando às diretrizes, fizemos uma consulta, um questionário, que foi distribuído via internet para pessoas do movimento negro, professores, secretarias de educação, estudantes… Muitas discussões foram feitas.
Ou seja: o tema foi amplamente discutido com a sociedade. Houve resistência?
E muita. Houve quem ponderasse, na época, que isso poderia acirrar o racismo, e até hoje há quem ainda diga isso. Quando a lei foi aprovada, houve manifestação de diferentes intelectuais contrários a ela.
“DIGO QUE ALGUMAS IDEIAS E SENTIMENTOS PRÉ-CONCEBIDOS CONTRA A POPULAÇÃO NEGRA INFLUI, SIM, NO FATO DE AS PESSOAS, POR EXEMPLO, ACHAREM QUE É DESNECESSÁRIO ENSINAR E EDUCAR AS RELAÇÕES RACIAIS NA ESCOLA, PORQUE ACHAM QUE ESTÁ TUDO BEM”
Entre os professores, também existe resistência em acatar a lei?
Não tenha dúvida, pois as leis de diretrizes exigem uma mudança de mentalidade do professor, uma mudança de mentalidade da relação do professor, inclusive com pessoas negras e da imagem que o professor tem das pessoas negras. Eu pergunto em cursos e palestras e peço para as pessoas pensarem: O que eu penso das pessoas negras? De onde vem o que eu penso sobre elas? Aprendi onde? Aprendi quando criança, brincando, ou aprendi estudando? De onde é que vem, qual é a raiz, a origem? Pergunto para as pessoas se darem conta de que elas, às vezes, se comportam sem ter muita clareza de onde vêm a origem e a raiz do seu comportamento.
A senhora diria que a resistência de alguns professores em não querer aplicar a lei se deve também a certo racismo?
Digo que algumas ideias e sentimentos pré-concebidos contra a população negra influi, sim, no fato de as pessoas, por exemplo, acharem que é desnecessário ensinar e educar as relações raciais na escola, porque acham que está tudo bem. De um lado é a necessidade de troca de mentalidade, de outro, um fato das normas legais que são adotadas. Os professores não têm ainda o hábito de lerem e interpretarem as leis de diretrizes, então, fica a cargo de uma coordenadora, de uma supervisora, que diz o que tem que ser feito. Fica nas mãos de um e de outro que pode até, por preconceito, fazer vistas grossas na aplicação da lei.
Em relação à lei, a maior crítica que se faz é quanto ao despreparo do professor para ensinar a matéria na sala de aula.
Os brasileiros precisam conhecer a história dos negros. O que acontece é que a lei de diretrizes de bases é, até certo ponto, explícita, mas tem muitos detalhes, trata de muitos níveis de ensino, e um artigo não dá toda a explicitação. Qual é o papel do Conselho Institucional de Educação diante disso? Interpretar as determinações legais, criar e oferecer elementos para que sejam implantadas. Quero dizer o seguinte: o termo, o artigo da lei é lacônico, mas as diretrizes curriculares que regulamentam para que se possa implantar são detalhadas. Uma das coisas que ela diz é que é preciso criar condições para que os professores implantem entre eles, recebendo informações, fazendo cursos, criando materiais. Mas isso cabe a quem? Cabe à Secretaria de Educação e aos próprios estabelecimentos de ensino, cabe às mantenedoras.
Existe alguma punição para a escola, professor ou secretaria que não esteja cumprindo a lei?
Por iniciativa do próprio Ministério Público, no Rio de Janeiro tem um grupo de advogados que estimulou essa cobrança. A minha universidade, por exemplo, já recebeu. O Ministério Público foi perguntando: Existe uma lei. O que vocês fizeram? Como universidade, tem cumprido o que está determinado? Recentemente, o Ministério Público da região de São Carlos chamou as secretarias municipais de educação e perguntou: O que vocês têm feito? Vocês têm um setor da secretaria ou uma seção para cuidar disso? Se não tem, tem que ter! Chamou a nossa universidade também para dizer: Eles precisam criar condições e vocês têm que ajudar a criar essas condições. O Ministério Público é que tem se encarregado e faz esse controle.
E qual tem sido a resposta?
Para você ter uma ideia, no Rio Grande do Sul, o Ministério Público fez uma cartilha para que não chegassem com a grande e maior desculpa que é: Não temos material!
Logo que foi promulgada a lei e que saíram as diretrizes curriculares, a gente até poderia dizer que os materiais eram muito escassos. Não é que eles fossem de fato inexistentes, mas acontecia que grande parte deles era produzida pelo movimento negro, por pessoas, individualmente. O número das publicações para divulgação era muito restrito, era apenas para aquele universo. Existia tanto que as professoras ligadas ao Movimento Negro ou, sabendo da existência dele, e que se deram ao trabalho de ler as diretrizes que indicavam que o Movimento Negro deveria ser consultado, fizeram isso e tinham material.
Mas, hoje, não dá para dizer que não há material. A Secretaria de Educação e o MEC publicaram muito coisa e compraram também.
Então, quem não aplica a lei atualmente, é mais por falta de vontade?
Eu acho que sim. Diria que é má vontade, na medida em que o projeto de sociedade inclui uma sociedade elitista, onde há discriminação. As pessoas vão ter que revisar as suas posições em relação às outras. Esse é o grande Brasil. Não é só saber algumas coisas. Então, o que acontece, as escolas estão fazendo ainda atividades pontuais.
O que a senhora achou da polêmica com o livro Caçadas de Pedrinho, de Monteiro Lobato?
O que está em questão no parecer do Conselho, com muita clareza, não é a qualidade literária da obra, que não está dizendo que ele é um mau autor.
Está dizendo que ele escreveu, em uma época, coisas que desqualificam a população negra, ele teve atitudes racistas e que isso vai reforçar essas atitudes nas crianças que lerem e vão fazer com que as crianças negras se sintam discriminadas, sofram e tenham vergonha de serem negras. É isso que está dizendo o parecer. É importante que o próprio livro chame a atenção do professor para este fato e que se faça um encaminhamento para saber como os professores lidam com isso. Há muito tempo não leio Monteiro Lobato e me dei conta do por quê chamam tanto as crianças negras de macacas. “Ah! O Monteiro Lobato está chamando!”A Emília é uma boneca, é o personagem preferido do … Seja uma boneca, uma árvore, um rato, não importa, esse personagem traz essa mensagem. Nas escolas chamam as crianças negras de macacas, mas o Monteiro Lobato está ensinando.
“A CRIANÇA NEGRA TEM QUE LER SABENDO QUE ESSA PESSOA ERA UMA PESSOA RACISTA, QUE NÃO GOSTAVA DE NEGROS. SE GOSTASSE, NÃO ESCREVERIA NEM SE REFERIRIA A ELES DESSA FORMA”
Qual a sua opinião sobre Monteiro Lobato?
Ele é um grande literato, mas era racista, tinha uma posição dentro de sua época e isso tem que ser pontuado. Eu vou fazer a crítica de uma obra literária? Vou sim, se essa obra faz mal para alguém. A criança negra tem que ler sabendo que essa pessoa era uma pessoa racista, que não gostava de negros. Se gostasse, não escreveria nem se referiria a eles dessa forma. E as crianças têm de ser reforçadas para não sofrerem. Elas têm que conhecer Monteiro Lobato e as crianças brancas têm que saber que ele era racista e que isso faz sofrer, desqualifica as pessoas e a gente quer uma sociedade democrática.
Como uma família deve agir se perceber que a escola de seu filho não obedece à lei?
Se o pai e a mãe perceberem que na escola de seus filhos estão contempladas somente imagens e histórias de crianças brancas, devem pegar o parecer e ir até lá dizer: “Olha, está escrito, foi o Conselho Nacional de Educação, quero ver quando vão obedecer a essa lei”. Tenho certeza que o dia em que os pais entrarem na escola com os pareceres, cobrando da escola, as coisas vão mudar.

TEXTOS E FOTOS MAURÍCIO PESTANA
Fonte : Revista Raça

sexta-feira, 4 de fevereiro de 2011

Divulgada lista de aprovad@s em segunda chamada no Sisu

Acesse aqui a lista de aprovad@s na segunda chamada do Sisu

O Ministério da Educação (MEC) divulgou nesta sexta-feira (4) a lista dos candidatos aprovados em segunda chamada pelo Sistema de Seleção Unificada (Sisu). Os estudantes deverão comparecer às instituições de ensino para as quais foram selecionados nos dias 8 e 9 de fevereiro para fazer a matrícula.

Nesta edição, o Sisu ofereceu 83 mil vagas em universidades estaduais e federais e institutos de educação profissional. Criado pelo MEC no ano passado, o sistema unifica a oferta de vagas em instituições públicas. Para participar, o candidato precisa ter feito o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem).

A lista dos documentos que os alunos precisam apresentar está disponível no site do programa no boletim individual do participante. Os candidatos podiam escolher até dois cursos no Sisu, elegendo sua prioridade. Aqueles que foram selecionados para a sua primeira opção e não fizerem a matrícula perdem a vaga. Os que foram aprovados para o segundo curso podem permanecer no sistema e ainda têm chance de serem convocados na terceira chamada prevista o dia 13 de fevereiro. Ao fim das três convocatórias, as instituições chamarão os candidatos para preencher possíveis vagas remanescentes a partir de uma lista de espera gerada pelo sistema.

quinta-feira, 3 de fevereiro de 2011

Teste da boneca - Racismo na infância

Ninguém nasce racista. Com quem que elas aprenderam?


Este teste foi realizado pela primeira vez nos anos 1940 pelo psicólogo americano Kenneth Clark. Quase 60 anos depois, o cineasta americano Kiri Davis recriou o teste. A pedagoga brasileira Roseli Martins realizou um teste semelhante com crianças brasileiras em 2006.

Quando Kenneth Clark testou 16 crianças afro-americanas em 1950, 63% (10 de 16) escolheu a boneca branca. Quando Davis testou 21 crianças afro-americanas em 2005, 71% (15 de 21) escolheu a boneca branca.

Martins testou 26 meninas (14 brancas, 12 afro-brasileiras) com 4 bonecos: um boneco menino, uma boneca negra, uma boneca branca com cabelo curto e uma boneca menina branca com cabelos compridos. Ela descobriu que 17 meninas (65%) escolheram a boneca branca de cabelo comprido, quatro (15%) escolheram o boneco menino e cinco escolheram a boneca negra (19%). Dos cinco que escolheram a boneca negra, somente 2 das 12 meninas afro-brasileiras (17%) escolheram a boneca negra.

As informações acima foram retiradas de um vídeo que apresenta uma recriação do teste no Brasil em 2009, e pode ser assistido aqui. Nessa versão são feitas várias perguntas. Os resultados foram:

Qual boneca é mais bonita? 17 (65%) escolheu a boneca branca, 9 escolheu a boneca negra.

Qual boneca é a boneca boa? 
11 (69%) escolheu a boneca branca, 5 escolheu a boneca negra.
Qual boneca você prefere brincar? 
6 (55%) escolheu a boneca a boneca branca, 5 escolheu a boneca negra.
Se você pudesse escolher apenas uma boneca pra comprar pra a sua irmã, qual você compraria? 
10 (67%) escolheu a boneca branca, 5 escolheu a boneca negra.

quarta-feira, 2 de fevereiro de 2011

Ah, mas o Demétrio Magnoli disse que não existem raças! Pra que cotas raciais então?

Um depoimento de um blogueiro negro responde muito bem aos protestos daquelxs que só não querem diferenciar branc@s e negr@s na hora do vestibular:

Um pouco sobre racismo e cotas

Entrei no mercado. O segurança ficou no meu pé durante todo o tempo. Eu tinha pressa, precisava voltar para os livros, estudar para a prova de Mecânica. Mas precisava também lavar a louça em casa, há muito tempo parada sobre a mesa servindo de heliporto aos insetos. Mas não tinha produtos de limpeza, precisava comprá-los. Fui ao mercado. Lá dentro, um segurança me seguia. Não tirava o olho de mim, aquilo me incomodou. Mas eu tinha pressa. Tirava e colocava a lista de compras no bolso de minha bermuda, conferindo a cada minuto o que deveria ou faltava comprar. Ao sair do mercado, após deixar 20% de minha bolsa de iniciação científica nas mãos do dono (sendo que menos de 1% disso representava os salários dos funcionários), o segurança me parou e perguntou educadamente se eu havia pegado uma buchinha, Scotch-Brite, e colocado no bolso sem querer. “Sabe como é, a gente precisa fazer esse tipo de verificação”. Tanto estava no meu pé como, ao me ver guardar a lista de compras no bolso, achou que eu concretizava aquilo que deveria ter me levado ao mercado.
***
Entrei no Centro de Práticas Esportivas. Ia à piscina. Nas férias, quando quase todos viajam e não tenho amigos na faculdade para jogar futebol ou qualquer esporte coletivo, apelo à natação, solitário. Chego à catraca onde diariamente mostro a carteira da faculdade a um dos seguranças que fazem ali o rodízio do cara-crachá. Sempre mostro o selo do exame dermatológico e minha foto, presentes na carteirinha. Apesar da rotina, uma jovem segurança solicita meu documento para inspecioná-lo, examiná-lo minuciosamente. Isso nunca ocorrera naquele centro, mesmo depois de nove anos na Universidade. Tudo bem, é serviço dela zelar pela segurança dos usuários do Centro, pensei. Mas não parou por aí. A carteirinha não a satisfez: teve que solicitar também meu RG.
- Vocês sempre pedem o RG para os usuários da piscina? – perguntei.
- É para garantir que todos os usuários pertencem à USP – respondeu comparando as fotos dos dois documentos.
- E o que lhe faz pensar que minha carteirinha não é minha, mas as dos outros usuários para quem você não a solicita são deles?
- É que há usuários que entram aqui sem pertencer à comunidade. Essa solicitação é para o bem de vocês.
***
Eu adorava D. Maria, faxineira do centro acadêmico. Nossa relação era afetuosa, como se nos conhecêssemos a anos. Tanto que ela me tratava como um parente. Certo dia, ela conversava com um dos diretores do centro acadêmico e, ao falar de mim, disse que eu era como um filho moreno dela. Intervi: “Não sou moreno, D. Maria. Sou negro”. Ela insistiu, dizendo que não, que eu era moreno. “Não, D. Maria. Não se preocupe, eu sou negro, não há problema nenhum em dizer isso”. Quando ela percebeu minha convicção quanto minha negritude, ela afirmou: “Poxa, meu filho! Mas eu estou tentando te ajudar!”
***
Visitando Jacareí/SP, há alguns anos, minha namorada e eu fomos a uma casa de uma grande rede de comidas árabes, o Habibs, no centro da cidade. Esperamos ser atendidos por 35 minutos. Os funcionários, predominantemente nordestinos, atenderam a absolutamente todos os clientes, predominantemente brancos, que chegaram depois de nós naquele estabelecimento antes de nos atender. O gerente da loja percebeu não apenas nosso constrangimento mas também o descaso dos outros funcionários com nossa presença na loja – não que fossêmos estrelas ou dignos de um atendimento preferencial, como também não éramos menos importantes que os outros clientes – e nos pediu desculpa pessoalmente.
Em São Paulo, em outras lojas da mesma rede, somos normalmente ignorados pelos seus funcionários, com maior frequência na loja da rua Augusta. Tanto que, ao irmos pela primeira vez ao Ragazzo (restaurante cujo dono é o mesmo do Habibis) da Alameda Santos, um funcionário na porta interviu: “Hoje estamos sem salgadinhos, todos acabaram. Temos apenas as massas do cardápio. Vocês podem ir ao Habibs se quiserem, é aqui do lado”, como se alguma coisa em nós lhe anunciasse que não queríamos comer as massas de seu restaurante.
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Meu Ensino Médio, em uma escola de um bairro de classe média da cidade em que vivi, meus amigos tentaram articular um namoro entre eu e a outra aluna negra de minha classe. Todos achavam que nós dois combinávamos.
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A biologia diz ter provado a inexistência de raças biológicas. Acredito piamente nisso. Não apenas por medo de alimentar qualquer tipo de eugenia, mas por achar desnecessário descrever o mundo em uma perspectiva que evoque raças biologicamente legitimadas.
Apesar de a única raça ser a humana, as situações reais pelas quais passei e acabei de descrever podem ser explicadas com ajuda do conceito de raça social, ou discriminação social por cor. Esse conceito prevê um comportamento pautado em uma diferenciação entre pessoas com aparências físicas diferentes, que não dependem do ponto de vista do diferenciado mas sim do diferenciador.
Os critérios utilizados para me diferenciar das outras pessoas no mercado, no centro esportivo, no Habibs, pelos meus amigos de infância e pela faxineira não dependem de buscar uma justificativa na biologia para serem levados a cabo. Por mais que as pessoas não gostem de racismo, suas ações são pautadas em uma distinção por cor, mesmo que de forma não deliberada. Isso pode ser justificado por uma herança cultural.
Um negro não tem o mesmo tratamento de um branco, mesmo comparando pessoas de classes baixas. Assim, se mesmo não havendo raças em termos biológicos existe discriminação racial na sociedade, não se pode garantir que critérios raciais não influenciem na formação pessoal de uma pessoa negra.
Por mais que alguns ainda acreditem na justiça da lei, há praticas sociais que a precedem. Por mais que a lei tente ser justa, não há garantias que a sociedade necessariamente também o seja. Enquanto a lei é posta para formar um corpo social, a sociedade deforma o cidadão à revelia da lei.
A assimetria no tratamento entre negros e brancos implica em formações diferentes. A sociedade não é a única influência na formação, embora seja relevante ao agir sobre os sujeitos aliada a outras forças. Dessa forma, uma pessoa que não vai se preocupar com um segurança atrás dela no mercado, que não vai ter a menor esperança de namorar uma pessoa branca quando criança, que sabe não poder ser miss caipirinha, que aparenta ser menos atraente economicamente para uma loja ou restaurante, e que se enquadra no perfil de prováveis suspeitos de crimes não vai lidar com o mundo da mesma forma com que lida uma pessoa privilegiada em tais circunstâncias. Essas pessoas vão interagir com o mundo de forma diferente e, por verem o mundo de uma ótica distinta, as diferenças de comportamentos entre brancos e negros vão sendo realçadas cada vez mais com o passar dos anos.
Hoje, dizer que brancos e negros partem de condições sociais iguais é uma falácia. Afirmar que tal assimetria deva ser ignorada em um exame como o vestibular, e que a concorrência é de igual para igual entre negros e brancos, é superestimar o papel da lei – que diz que todos devem ser tratados iguais, independente de raça, cor, credo, religião, sexualidade. Ao mesmo tempo, é subestimar o papel da cultura nas relações humanas e consolidar a exclusão social de pessoas para as quais nunca houve uma política pública voltada para incluí-las em uma sociedade há séculos pautada em discriminação racial, seja a legitimada pela biologia, seja pela própria sociedade.